Construção de 21 mil km de estradas de ferro no Brasil abre oportunidades de execução de obras civis para construtoras nacionais. Terrenos do entorno das ferrovias tendem a valorizar
A retomada dos investimentos na malha ferroviária brasileira, após três décadas de estagnação, abre oportunidades para projetos de construção e duplicação de ferrovias e de recuperação da infraestrutura existente. As iniciativas já anunciadas para revitalização do setor somam aportes da ordem de R$ 147 bilhões até 2023. “Cerca de 70% das obras das ferrovias são civis”, afirma Vicente Abate, presidente da Abifer (Associação Brasileira da Indústria Ferroviária). A participação da construção civil abrange terraplenagem em grande escala, construção de pontes, viadutos, passagens inferiores, valetas, drenos e construção de superestrutura ferroviária.
O primeiro passo para as empresas que pretendem ingressar nesse nicho é obter o atestado de capacitação técnica. A dica é de Luiz Carlos Machado, superintendente de obras da Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., administradora dos programas de operação da infraestrutura ferroviária nas ferrovias outorgadas a ela pelo Governo Federal. São cobradas ainda experiências no tipo de obra que será prestado e em projetos de grande porte, além de capital social compatível ao valor do projeto. “A vivência no setor ferroviário, apesar de não ser um pré-requisito, pode ser considerada um diferencial nos processos seletivos”, acrescenta Daher Filho.
Ainda que as demandas abranjam tanto as empresas de pequeno porte quanto as multinacionais, o diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), Rodrigo Vilaça, garante uma maior absorção das organizações de maior representatividade na engenharia civil. “Até porque geralmente exige-se suporte econômico expressivo. As obras são de médio e longo prazos, os retornos não são imediatistas”, justifica. “Portanto, por uma característica das próprias obras ferroviárias, se tornam mais propícias as contratações das grandes empresas”, completa.
O desenvolvimento do setor ferroviário conta com o aporte financeiro e a participação direta das três esferas governamentais – federal, estadual e municipal – e do setor privado. “Enquanto os projetos metroviários estão sob gestão dos Estados, os veículos leves sobre os trilhos (VLTs) são gerenciados pelos municípios. Já o TAV (Trens de Alta Velocidade) e as obras de transportes de cargas ficarão a cargo de empresas privadas que conquistarem as concessões do Governo Federal. Há alguns projetos, no entanto, que permanecem no comando do Ministério do Transporte”, descreve Vilaça.
A Valec Engenharia, Construções e Ferrovias é a empresa responsável por gerir os projetos ferroviários pertencentes ao Governo Federal – tais como as ferrovias Norte-Sul e Oeste-Leste. Já a maioria das concessões do setor está nas mãos da Vale, Transnordestina Logística, América Latina Logística (ALL), MRS e Ferrovia Tereza Cristina.
Ao longo de 2010, a Valec prevê a contratação de aproximadamente 40 empresas da área de engenharia civil. “Neste ano, iremos construir cerca de 2.200 km de construção, o que demandará a abertura de 20 lotes de construção”, cita Machado. Por ser uma empresa pública, as contratações são realizadas por meio de licitações. “Ganham as organizações que atendam os pré-requisitos descritos nos editais e apresentem as melhores propostas financeiras”, enfatiza o superintendente, que calcula os valores médios dos contratos de R$ 450 a R$ 500 milhões. Ele orienta ainda que as interessadas fiquem atentas ao site da Valec, ao Diário Oficial da União e aos jornais de grande circulação.
Já as consorciadas, embora não trabalhem com licitações, adotam um processo seletivo similar. “As seleções avaliam as capacidades técnicas das participantes e contratam aquelas que obtiverem o melhor ‘currículo’”, diz o presidente da Transnordestina Logística, Tufi Daher Filho, que promete a retomada das contratações na consorciada a partir de junho de 2010.
Repercussão imobiliária
Os ganhos da engenharia civil com a expansão da malha ferroviária brasileira não se limitam a participação nos canteiros das ferrovias. “A história de que muitas cidades nascem com a chegada de estradas de ferro não é fictícia”, garante Abate, que cita o exemplo de Cruzeiro, município do interior de São Paulo.
Segundo Marcelo Perrupato, secretário de política nacional de transportes do Ministério dos Transportes, a implantação de cada uma das propostas do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e do PNLT (Plano Nacional de Logística e Transporte) contemplará a reurbanização e o desenvolvimento imobiliário e econômico de suas regiões. “O desenvolvimento ao redor de todas essas localidades onde as novas obras estão sendo feitas geram expectativas perfeitamente justificáveis e o resultado dessas iniciativas serão vistos em breve”, garante o secretário do Ministério do Transporte.
“Por exemplo, com o projeto do TAV, pessoas que moram hoje em São Paulo ou no Rio de janeiro poderão perfeitamente morar em cidades do interior, com mais conforto e qualidade de vida”, cita Perrupato, que acrescenta ainda o aumento na demanda do mercado imobiliário no eixo Rio de Janeiro-São Paulo-Campinas. Na opinião de Abate, também será visível a valorização dos terrenos próximos aos projetos ferroviários. “Sai ganhando quem antecipa a compra de imóveis e terrenos nas redondezas das obras”, alerta.
Por isso, vai a dica: “As iniciativas do governo para revitalizar o setor ferroviário vão atender às regiões onde há expansão da atividade econômica, para promover a integração regional e criar facilidades para a exportação dos produtos nacionais”, diz Perrupato, do Ministério dos Transportes.
Dentre os principais investimentos na expansão da malha ferroviária brasileira previstos para os próximos anos estão a ferrovia Nova Transnordestina, que pretende integrar o Nordeste a partir da ligação do município de Eliseu Martins (PI) aos portos de Pecém (CE) e Suape (PE), e à Ferrovia Norte-Sul. Outra importante obra para a região é a Ferrovia de Integração Oeste-Leste, de 1.490 km de extensão, que vai ligar o Porto de Ilhéus, na Bahia, a Figueirópolis, em Tocantins. No setor de cargas há também a extensão da Ferronorte e da Ferrovia Norte-Sul. “Com essas e outras obras ferroviárias o Governo Federal interligará os portos da região Norte e Nordeste aos do Sul e do Sudeste do País”, garante Perrupato. Na área de transporte de passageiros, Rodrigo Vilaça, diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), ressalta 12 projetos de trens turísticos e o incremento dos trens metropolitanos, principalmente no Estado de São Paulo.
Atualmente, o País tem 29 mil km de linhas ferroviárias. “Número ainda muito inferior se comparado à extensão do território brasileiro”, avalia Abate. Até 2018, a previsão é criar outros 12 mil km de trilhos. A meta é ainda mais audaciosa para 2025, quando se pretende aumentar a cobertura ferroviária no Brasil para 50 mil km, ampliando consecutivamente a participação das ferrovias na opção de transporte de carga e de pessoas.
Mesmo diante das incertezas que as eleições presidenciais de 2010 podem gerar, Vilaça, da ANTF, acredita na continuidade dos projetos ferroviários pré-definidos nos programas nacionais. “Independentemente dos resultados, não há possibilidades de retrocesso. Isso porque além de se tratar de um País considerado a sexta potência do mundo na década, com eventos internacionais significativos sob sua responsabilidade, a logística brasileira precisa reduzir seu custo logístico”, esclarece Vilaça. “É um projeto de País e não de governo. O desenvolvimento do setor ferroviário é a solução para todos os mares”, acrescenta Abate.
Principais obras da malha ferroviária brasileira